Marcelo Leite, Folha de São Paulo, ‘falou e disse’ muita bobagem sobre a evolução

domingo, novembro 30, 2008

Eu não vou entrar em detalhes sobre o artigo “Criacionismo no Mackenzie” [via JC E-Mail] de Marcelo Leite, publicado no caderno Mais!, Folha de São Paulo, 30/11/2008, e nem vou defender o direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, uma instituição de ensino confessional ensinar o credo de sua religião.

Eu sou muito suspeito para escrever neste blog sobre Marcelo Leite ou qualquer outro jornalista científico da Folha de São Paulo: há uma década eu denuncio as insuficiências epistêmicas fundamentais das atuais teorias da origem e evolução do universo e da vida, e que a editoria de ciências e o caderno Mais! da FSP não praticam jornalismo científico objetivo e nem seguem o Manual de Redação da Folha de São Paulo que tem por objetivo “produzir um jornalismo crítico, moderno, pluralista e apartidário.” [1] Nada mais falso!

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Por que sou suspeito? Eu sou suspeito porque não contemporizo com jornalistas assim, e denuncio há uma década a relação incestuosa entre a Grande Mídia e a Nomenklatura científica quando a questão é Darwin. A máxima da censura na FSP a la Marcelo Leite é: “Não damos espaço”. [2]

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Ironia do destino: a FSP que lutou recentemente contra uma ditadura e pela liberdade de pensamento e expressão, não “ouve o outro lado”, violenta a nossa cidadania quando sonega informações atualizadas aos seus leitores não-especializados que a teoria geral da evolução de Darwin através da seleção natural está nos seus estertores de capacidade heurística no contexto de justificação teórica, e que logo após as cerimônias de louvaminhice, beija-mão e beija-pé de Darwin, será discutida uma nova teoria da evolução: a Síntese Evolutiva Ampliada que, contrariando a Darwin e seus discípulos pós-modernos como Marcelo Leite, não será selecionista.

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Do alto de sua torre de marfim, Marcelo Leite pontificou “ex-cathedra”:

1. “Inúmeras observações comprovam postulados centrais do darwinismo, como a ascendência comum (todas as espécies provêm de um ancestral único).”

Marcelo Leite só não informou aos seus leitores de onde ele tirou esta afirmação. Como jornalista renomado e com doutorado pela Unicamp, ele deve se informar melhor a respeito dessa questão de “ascendência comum”, pois a situação nesta área é de muita controvérsia, i. e., as observações não comprovam este postulado central do darwinismo [muito obrigado, Marcelo Leite por esta pérola: os darwinistas fundamentalistas dizem que somente os oponentes e críticos é que usam o termo “darwinismo” e de forma pejorativa]. A Árvore da Vida de Darwin está mais para gramado do que árvore!

Ernst Mayr, onde você estiver, muito obrigado por afirmar que a Biologia evolutiva não é uma "ciência dura" como a Física que tem leis com que trabalhar: tem apenas um princípio - a seleção natural. A Biologia evolutiva é uma teoria científica de longo alcance histórico, e fica muito difícil "comprovar " o fato, Fato, FATO da evolução - descendência com modificação (ancestral comum) porque não temos como pontuar cada uma dessas etapas. É um fato, Fato, FATO aceito a priori, quando a ciência baconiana preconiza "Empirica, empirice tratanda"! [As coisas empíricas são empiricamente consideradas] Darwin não fecha essa conta!

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

2. “O fato de o DNA ser a molécula da hereditariedade em todas elas é a melhor prova desse princípio. Os primeiros seres vivos da Terra “inventaram” [SIC ULTRA PLUS: teleologia] essa maneira de transmitir características de uma geração a outra, há cerca de 4 bilhões de anos, e ela se perpetuou desde então.”

Marcelo Leite mostra aqui que precisa se atualizar urgentemente na literatura especializada, pois o código genético não é universal: desde 1985 os biólogos moleculares descobriram pelo menos 18 códigos genéticos diferentes em várias espécies. [3] Muitos deles são significativamente diferentes do código genético padrão. [4]

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Do alto de sua torre de marfim, Marcelo Leite ficou “indignado” porque “a direção do Mackenzie não nega os avanços da biologia trazidos pelo darwinismo, mas acredita que é preciso opor-lhe o contraditório.”

Marcelo Leite sabe, mas finge não saber, não existe “Theoria perennis” em ciência. Muito menos uma teoria elaborada no século 19 que até os mais próximos de Darwin como Thomas Huxley, Charles Lyell, Joseph Hooker e St. George Jackson Mivart duvidavam do poder criativo da seleção natural. Em pleno século 21, Marcelo Leite “evangelicamente” aceita a evolução por meio da seleção natural pela fé!

O Mackenzie, enquanto instituição confessional, tem sim o direito de apresentar aos seus alunos “que há outra explicação” para o "Mysterium tremendum" da origem das espécies.

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Marcelo Leite, que traduziu um dos livros de Ernst Mayr, deveria saber qual foi a opinião do “Darwin do século 20” a respeito do livro “Origem das Espécies”: a “grande obra” de Darwin era um livro confuso, e não explicou o que se propôs explicar: a origem das espécies! Será que o Marcelo Leite não sabe disso? Sabe, mas como é Darwin, e tutti cosa nostra, capice?

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Marcelo Leite tentou “demonizar” a teoria do Design Inteligente [sinais de inteligência são empiricamente detectados na natureza] equiparando a TDI com o criacionismo na seguinte afirmação:

“A coleção utilizada com crianças de 6 a 9 anos se chama Crescer em Sabedoria. Na capa do volume do terceiro ano estava estampado ‘Ciências - Projeto Inteligente’. É uma alusão ao argumento do “design inteligente”: a natureza é tão complexa e os organismos tão perfeitos que só o desígnio de um arquiteto (Deus) pode ter sido responsável por sua criação.

A TDI como teoria científica não pode lidar com aspectos ontológicos. Nós somente propomos que todas as vezes que encontrarmos nos objetos bióticos sistemas de complexidade irredutível [Michael Behe, “A Caixa Preta de Darwin”, Rio de Janeiro, Zahar, 1998] e informação complexa especificada [William Demsbki, “The Design Inference”, Cambridge, Cambridge University Press, 1998], são indicações de “design inteligente”.

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Eu vou fazer aqui o papel de “Advogado do Diabo” da direção do Mackenzie: ela está plenamente justificada da omissão da evolução por seleção natural, porque até a Nomenklatura científica não aceita mais esta tese do século 19. Nem Darwin acreditava nisso: era o mecanismo mais importante, mas não era o único. O fato, Fato, FATO da evolução é explicada assim: “Se não for X, então Y, se não for Y então Z, se não for Z, então todo o ABC”. E tome transferência lateral e horizontal de genes, y otras cositas mais!

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

Eu vou fazer agora o papel de “Promotor do Diabo” contra o Mackenzie: Não deveria ter excluído, se é que excluiu a Darwin. Antes, o ensino da evolução deveria receber o tratamento científico que não acontece em nenhuma sala de aula de escolas públicas brasileiras dos ensinos fundamental, médio e superior: ensinar as evidências a favor e contra a evolução.

Isso, Marcelo Leite, deveria sim fazê-lo corar de vergonha, pois é excluído dos PCNs, em detrimento a uma formação acadêmica adequada de nossos alunos.

NEM MEIA DÚZIA DE JORNALISTAS SE PRONUNCIOU!

NENHUM JORNALISTA SE PRONUNCIOU!!!

NOTAS:

1. Manual de Redação. Folha de São Paulo, 2ª. ed., São Paulo, Publifolha, 2001, p. 10.

2. Declaração de Marcelo Leite na mesa-redonda da V Sao Paulo Research Conference, Auditório da Faculdade de Medicina da USP, 20 de maio de 2006. Naquela conferência este blogger apresentou um pôster diferente de todos os outros pôsteres: “Uma iminente mudança paradigmática em biologia evolutiva?”.

3. Aqui. Digite genetic codes para pesquisar os diferentes códigos genéticos.

4. Vide Christine Fenske, Gottfried J. Palm e Winfried Hinrichs, “How unique is the genetic code?, Angewandte Chemie International Edition 42 (2003):606-610.